domingo, 2 de dezembro de 2012

137º CAFÉ FILOSÓFICO (QUATRO ANOS) - A AMIZADE




Há umas semanas atrás um dos participantes num Café Filosófico sugeriu uma questão para discussão que, na altura, foi ignorada pelo grupo. "Se eu cair levantas-me?" foi a pergunta sugerida pelo Filipe Louro.
Eu próprio não achei esta pergunta interessante e não procurei que o grupo a aprofundasse. No entanto talvez por ser uma pergunta um pouco estranha ficou-me na cabeça desde então e frequentemente dava por mim a voltar a ela mais para tentar perceber a sua intenção e significado que para lhe tentar responder.
Vejo agora que ignorar essa pergunta foi um erro pois era uma pergunta nos poderia levar a pensar sobre conceitos que a todos nos dizem muito como solidariedade, amor, amizade, ajuda, etc. E foi a nossa tendência para evitar o "estranho" e procurar o "normal" que nos fez abdicar desta pergunta e escolher outra mais convencional.

Umas semanas mais tarde, num outro Café Filosófico, falou-se da Amizade que deve existir sempre que dois seres humanos se encontram para dialogar pois não há diálogo entre duas pessoas que se ignoram ou se odeiam. E ao pensar nisso essa estranha pergunta do Filipe voltou-se a apresentar ao meu espírito. Essa pergunta fez-me ver que qualquer ser humano que veja alguém cair à sua frente, mesmo um desconhecido, sentirá um impulso para o ajudar a levantar-se. Na realidade poderá não o fazer por inúmeros motivos, mas acredito que esse impulso está presente em todos nós e, acredito também, é sinal de que há um sentimento comum que une todos os seres humanos e que nos leva a querer instintivamente ajudar o próximo. Por que não chamar a esse sentimento Amizade? Essa pergunta fez-me ver que a Amizade pode ser uma coisa efémera e episódica, como uma onda no mar que apenas passa por nós uma vez mas que nos afecta e marca de determinada maneira. Um amigo pode ser assim como uma onda que passa por nós uma vez e nunca mais volta a passar, mas naquela passagem, naquele curta presença, com ou sem diálogo, foi nosso amigo.

Pensava nisso e pensava também nas centenas de amigos que, como ondas, passaram pelo Café Filosófico nos últimos quatro anos. Aqueles que quase sempre regressam quando o fazem já não são os mesmos, são sempre outras ondas quando regressam. E mesmo aqueles que só nos procuraram uma vez e não mais voltaram, também esses foram nossos amigos enquanto mantiveram a disposição de dialogar. Esses apenas deixaram de ser nossos amigos até ao próximo Café Filosófico, quando nos procurarem de novo para dialogar. Lá estaremos à sua espera.

A Chantal é uma daquelas ondas que insiste em bater na praia e regressar uma e outra vez ao Café Filosófico. É uma amiga que esteve em muitos dos nossos encontros e, talvez por isso, tenha a sensibilidade apurada para as pequenas grandes coisas que se passam num Café Filosófico. Essas "pequenas grandes coisas" são aquelas que normalmente existem nos interstícios da discussão principal e que pouca gente dá por elas mas que são verdadeiramente o que dá um sabor especial e único a cada Café Filosófico. Neste último Café Filosófico a Amizade foi uma dessas "pequenas grandes coisas".

Deixo-vos a prenda que a Chantal nos deu a todos do Café Filosófico pelo nosso 4º Aniversário.
Um pequeno texto sobre o "tempero das palavras" que tanto valorizamos nos Cafés Filosóficos e uma imagem do "caminho que ainda temos a percorrer."
Não sei se a Chantal pensa assim, mas para mim aquela é uma montanha que nunca iremos escalar. O caminho é demasiado bom para o deixarmos para trás!




Chantal Guillonato
«O que sabemos: palavras; o que sonhamos: palavras; o que sentimos:
palavras; e a nossa própria boca que fala é, também ela, só uma frágil
e insegura palavra» (M.A. Pina).
Ditas às escuras, com pausas estreladas, ou à luz de um terceiro
andar. Palavras. Irrequietas, impacientes, teimosas, velozes.
Palavras. Tantas vezes trincadas em prol de uma maltratada fome de
conhecimento. Palavras. Que observadas de perto, são formas vivas, com
contornos por definir. Quatro anos em que me/nos tens ajudado Tomás. A
trepar métodos e pensamentos. A temperar palavras. Gosto cada vez mais
delas, sobretudo as silenciosas. As que nos vão trepando pelo corpo à
procura de uma saída de emergência. Fecha-te Sésamo. Palavras. Que
presas ganham, com o passar do tempo, um sabor especial a impulso
sublimado.
Palavras. Que dançam quando bem conduzidas. Gosto cada vez mais dos
passos. Palavras. Que vão ficando em segundo plano. Quem diria.
Palavras. Que caminham sem pressa de chegar.
«Acontece assim nos sonhos. Temos medo e sonhamos com a esfinge. A
verdade, porém, não é a esfinge, a verdade é o medo; a esfinge é só a
imprecisa forma do nosso medo» (M.A. Pina).
Obrigada Tomás por seres nosso amigo.

Chantal

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